sábado, 25 de abril de 2009

Dois nobres sentimentos (ou: a raiva e a vingança)

"Apesar de dizerem que não se deve viver com raiva no coração, sentir raiva é estimulante, e, se alguém fez uma coisa contra você, nada mais saudável do que odiar essa pessoa. Odeie muito e, se possível, verbalize seu ódio. A raiva evita infartos, gastrites, úlceras, e pessoas normais às vezes sentem ódio do marido, dos filhos, do pai, da mãe, do amigo, do chefe, da empregada e do mundo em geral – o que é ótimo, pois só os que sentem muita raiva são capazes de amar muito. E é aí que, às vezes, entram as vinganças, que são sempre por justa causa – ou você já quis se vingar de alguém que te mandou flores?
Eu, na verdade, sou de raivas violentas, mas de poucas vinganças – apesar de saber que desde o começo da humanidade vingança é coisa de mulher; inveja do pênis, inveja da mãe, que dorme com sua primeira paixão, o pai – e tome vingança.
Nem todas precisam ser feitas por nossas próprias mãos: às vezes a vida se encarrega disso, e a gente ainda pode achar que tem superpoderes mentais. Dar a outra face é patético e, cá entre nós: olho por olho é bem mais gostoso. Desde que o mundo é mundo, mulheres são melhores vingadoras do que homens, e qualquer uma sabe preparar, com suprema maestria, um míssil de maldades para o filho levar no fim de semana que vai passar com o pai e a nova mulher.
Mas atenção: não se deve confundir vingança, que é uma resposta a alguma coisa concreta e imperdoável que fizeram contra você, com inveja; inveja porque a outra é mais magra, mora no apartamento que você queria ter, namora os homens que você queria namorar. A inveja é um sentimento humano que não provoca vingança, necessariamente.
Alguns dizem que existe inveja boa e inveja ruim, será? As minhas são, todas, escandalosamente péssimas.
Vamos aos exemplos:
Eu tenho uma amiga que brigou com a síndica do prédio porque esta resolveu botar uma fechadura na portaria, outra na porta do elevador (no térreo) e outra nas portas do elevador, em cada andar – todas diferentes. Depois de anos de discussão sobre o absurdo da coisa, e sem resultado, sabe o que fez minha amiga? Desceu, na calada da noite, com dois tubos de Araldite, misturou as colas e entupiu a fechadura da porta do elevador (a do térreo). Grande confusão, uma assembleia extraordinária foi convocada, falaram horrores sobre o vandalismo de quem havia praticado tal ato (e minha amiga apoiou com veemência). A fechadura foi trocada, e ela repetiu a façanha. Isso aconteceu seis ou sete vezes, até que desistiram. Acho esse tipo de vingança um primor, a ser copiado e até aperfeiçoado, se for o caso.
Outra amiga tinha um namorado, e uma vadia resolveu dar um jantar e convidá-lo. Nesse dia, ela botou seu vestido mais sexy, fez o namorado beber bastante e se esquecer do mundo. Quando acordou no dia seguinte, ele se sentiu – com razão – o último dos gentlemen. Minha amiga, muito gentil, disse que ele deveria mandar umas flores, e até se prontificou a ir comprar, já que o namorado, de ressaca, não tinha condições. Com o cartão (escrito por ele) na bolsa, ela foi ao florista em frente ao cemitério e escolheu um buquê de palmas-de-santa-rita tingidas de azul-turquesa, o que sepultou qualquer intenção que a a outra tivesse em relação a ele; pode ser melhor?
Como sou muito sincera e honesta mas estou com a memória fraca (para o que não me interessa), devo dizer, a bem da verdade: não tenho certeza se essas histórias se passaram com uma amiga ou comigo mesma, o que, aliás, é irrelevante: pelo tempo, elas já prescreveram.
Existem também outros tipos de vinganças, a maior parte das quais dirigidas às piranhas que se engraçam com seu namorado, com seu ex-namorado, ou com qualquer homem que você pensou em namorar um dia. Nesses casos você não só pode como deve, distraidamente:
*grudar um chiclete na nova bolsa (Fendi) dela que custou 1 500 dólares;
*deixar um recado na secretária eletrônica convidando para uma grande festa a que todo mundo está louco para ir; como o nome dela não estará na lista da porta, ela será barrada;
*indicar um lugar maravilhoso na periferia onde se podem comprar roupas de grife por um preço ínfimo – e dar o endereço errado;
*dizer, com muita gente em volta: “Sua plástica ficou maravilhosa”;
*lembrar, na presença do novo namorado dela, da noite em que ela bebeu demais e teve que sair carregada; mas isso tem tanto tempo, foi nos anos 50 – lembra, meu bem?

Se nada disso aplacar seu ódio, fure o olho dela – sempre haverá alguém que vai compreender. Eu, por exemplo.
E tem a melhor de todas, que é a vingança construtiva. É aquela que te faz pensar: “Ah, é? Pois agora ele (ou ela) vai ver”, e a partir daí conseguir vitórias extraordinárias no trabalho, na vida afetiva, na aparência física, e chegar ao sucesso, enfim – ou à paz total. Quem foi que disse que viver bem é a maior vingança?"

( Danuza Leão em Na sala com Danuza )

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